segunda-feira, 23 de maio de 2011

NATAL


Uma palavra mágica que de repente desperta em meu coração adormecido durante um ano inteiro. Tempo de refletir antes de celebrar. O que fiz durante todo esse ano? Onde estou e para onde vou? Diante deste questionamento assusto-me, e de súbito o espectro do comodismo me acolhe em seus aposentos. Admito, é assustadoramente terrível enfrentar essa pergunta.
Somos os mesmos, não há dúvida, e também não há indício convincente, suficientemente comprovado, de que houve transformação. Até porque não guardamos um registro vivo em nossa memória que se alimenta apenas do surto dos acontecimentos, esses que podem impactar ou não com certa magnitude ou profundeza no curto prazo de alegria e de dor que a vida nos impõe, na reciclagem do seu constante movimento. Sim, infelizmente constato que somos esquecimento, elemento perecível e consumível.
Existimos como marinheiros navegando em mares infinitos, à mercê dos alísios ventos e das borrascas, tendo por leme a visão de um sonho, fincada na linha do horizonte inexorável da existência, e por baliza a força de vontade, e certo equilíbrio interior para prosseguirmos.
Prosseguirmos, meu Deus! Para onde? Como desemaranhar a teia urdida pela ardilosa trama social, com suas regras preestabelecidas, seus preceitos que não passam de rotineiros clichês e frases de efeito. E, ah sim, datas para celebrar, como, por exemplo, esse Natal que presencio hoje, órfão de calor humano verdadeiro, duradouro. Esse é um Natal cuidadosamente costurado para beneficiar apenas a desenfreada promoção de consumo, totalmente insustentável para a alma humana, de coisas que as pessoas realmente não precisam ter.
Que me perdoem as crianças, mas esse Natal meu presente será um minuto de silêncio. Um minuto, tão-somente, para sentar e relembrar quem nasceu já sabendo de seu futuro sacrifício em prol da humanidade, e que não fugiu de seu destino. Hoje, mais do que nunca, precisamos de alguém assim, comprometido, corajoso, sonhador que veja o mundo com um olhar inusitado, e que perceba cores e formas harmoniosas, mesmo que isso se traduza na perda total da sua zona de conforto.
E retorno à palavra Natal, essa que despontou titubeante, frágil, na página alva do meu pensamento, para dizer que é preciso sonhar. Sonhar um Natal que nos aproxime mais um ao outro, e que seja um ato duradouro, puro nas suas intenções, uma bela semente para as flores futuras que não veremos desabrochar.
Por fim, um Natal que seja conforto espiritual para todos, e uma prece fortalecedora cujo vigor e vibração não findem simplesmente com o nosso Amém.

© Jean-Pierre Barakat

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